sábado, 2 de janeiro de 2010

Uma visita sublime

A ausência das cores em suas vestimentas, a saudade em seu coração, e, todos os dias, lá está ela, preenchendo o vazio do que restou. É sempre assim, diariamente ela cuida dele, como o fez durante a presença do seu corpo ainda quente ao seu lado. O coração repleto de saudade, a memória dos dias de felicidade, do cheiro de suor do seu corpo, e agora apenas o cheiro de terra molhada, de flores arrancadas de suas raízes como ele próprio o foi. É assim, a perda da vida simplesmente nos cortam pelas raízes.

Tudo em seu devido tempo. As dores das mãos ainda inchadas pela osteoporose, as cãibras nas pernas. É manhã: ela se levanta, toma o seu pequeno almoço, já pensando como será o dia de trabalho, a praça estará cheia hoje, batatas, grelos, hortaliças, será tudo vendido, não sobrará nada. Com esses pensamentos, desce os dezoitos degraus de sua casa em direcção à praça. A aragem gelada em sua face descoberta, e ela caminha em passos rápidos. Bom dia, bom dia, bom dia, preciso correr, onde estão as chaves? Caraças!… E assim se passa mais um dia, o qual não pode ainda acabar, pois ele ainda a espera lá, para acender a lamparina, trocar as flores, ver se está tudo em ordem, até que suas raízes também sejam cortadas, como as de todos nós um dia serão.

2 comentários:

  1. A vida e seus amores...amores que são animados não pela presença física, mas pelo amor que sustenta todo o existir!!! Adorei o texto!!!
    Bjs,
    Cláudia.

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  2. Verdadeiro, profundo e real, este texto nos faz pensar quantas milhares de pessoas vivem esta mesma situação, pessoas diferentes que partilham deste mesmo sentimento.
    Adorei o texto muito bem escrito e relatado. Parabéns, és muito talentoso.
    Lilian Nascimento

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